quarta-feira, 8 de abril de 2020
tcc sobre o grupo matrakaberta na ucb
CONTADORES
DE HISTÓRIAS: O PODER DA PALAVRA FALADA[1]
Patrícia
da Costa Sousa
RESUMO: Este artigo tem por objetivo
analisar o reaparecimento do contador de histórias no mundo contemporâneo. O
recorte teórico foi feito a partir dos estudos dos críticos literários Walter
Benjamin, em seu ensaio “O narrador”
e Paul Zumthor em “Performance, recepção,
leitura”. Antes de tratar dos contadores contemporâneos, é necessário
reportar-se ao contador de histórias na antiguidade, que através da palavra
falada transmitia os valores e conhecimentos do mundo para a geração mais nova.
Discorrer sobre os contadores de histórias implica discorrer também sobre a
importância da tradição oral na constituição das sociedades antigas.
Palavras-chave: Contadores de histórias. Memória. Tradição oral.
Performance.
INTRODUÇÃO
A escolha
do tema deste artigo surgiu devido ao meu interesse pela contação de histórias,
despertado por um folheto do Grupo Matrakaberta entregue por uma colega em
sala de aula. Fiquei encantada, e o desejo de conhecer mais sobre o mundo dos
contadores de histórias tomou conta de mim.
A
curiosidade foi decisiva para o desenvolvimento deste artigo, pois, a cada
leitura, o mundo da contação de histórias invadia a minha vida. Os estudos
sempre deixavam um gostinho de “quero mais”.
Mesmo
já tendo certo conhecimento sobre o assunto, transportá-lo para o papel nem
sempre foi tarefa simples. O processo da escrita do tema tornou-se mais fácil
após entrevista com a contadora de histórias Adriana Maciel – na verdade um bate
papo muito gostoso. Foi no compartilhar de suas experiências que este trabalho
começou a ser desenvolvido. Atribuo isso ao poder da palavra falada. O intercambiar experiências, nas palavras
de Benjamin, foi decisivo e enriquecedor. Sem isso, este trabalho estaria
incompleto.
Neste
artigo, antes de apontar a contação de histórias propriamente dita,
apresenta-se em poucas linhas a importância da tradição oral, em seguida a
autoridade que os idosos dispunham na sociedade e o modo como o conhecimento
era preservado através da memória. Também é mencionado o papel exercido pelos
contos de fadas, testemunho dos valores e língua de um povo.
Em
sequência, são apresentados os motivos que culminaram no desaparecimento do
narrador e o ressurgimento do contador de histórias nos centros urbanos da
atualidade. São mostradas a performance
dos contadores de histórias e algumas técnicas para o desenvolvimento da
narrativa.
Por
fim, apresento parte do trabalho do Grupo
Matrakaberta – História e Bonecos, grupo de contadores de histórias de
Brasília, que me serviu de inspiração para a concretização deste trabalho.
TRADIÇÃO
ORAL
Os
contadores de histórias têm suas origens na tradição oral, pois o conhecimento
era transmitido verbalmente de uma geração para outra; graças à oralidade, as
sociedades antigas foram preservadas. Para consolidar tal afirmativa,
valemo-nos dos estudos realizados por Vansina, historiadora e antropóloga, que
focaliza seus estudos sobre a tradição oral dos povos africanos e nos apresenta
a definição de tradição oral: “testemunho
transmitido oralmente de uma geração à outra. Suas características particulares
são o verbalismo e sua maneira de transmissão se difere das fontes escritas.”
(VANSINA, 1982, p.158).
Considerando
que, o “corpus da tradição oral é a
memória coletiva” (VANSINA, 1982, p.158), podemos afirmar que a tradição
oral não é feita de todas e quaisquer informações verbais produzidas, mas sim
daquelas que estão no inconsciente coletivo (constituído por toda a experiência
ancestral, enriquecida de inúmeras variações) e são responsáveis pelo
estabelecimento da identidade de determinado grupo social. Por isso, o estudo das tradições orais é
complexo. A flexibilidade da palavra falada dificulta a definição de um
testemunho como documento oral. Ao testemunhar um episódio, o falante pode
fazer correções, recomeçar e até mesmo interromper a narrativa. Isso é
perfeitamente aceitável e não desconfigura o documento. Entretanto, a partir do
momento em que novas informações são acrescentadas já se trata de outro
testemunho.
Sobre
o contexto social da tradição, Vansina (1982, p.163) explica:
Tudo
que uma sociedade considera importante para o perfeito funcionamento de suas
instituições, para uma correta compreensão dos vários status sociais e seus
respectivos papéis, para os direitos e obrigações de cada um, tudo é
cuidadosamente transmitido. Numa sociedade oral isso é feito pela tradição,
enquanto numa sociedade que adota a escrita, somente as memórias menos
importantes são deixadas à tradição.
A
memória exercia papel fundamental nessas sociedades. Através dela é possível
reconstituir o cotidiano de um grupo social. Bosi (2003, p. 54) declara que a
comunidade familiar era testemunha e intérprete das experiências e lembranças,
ou seja, tais lembranças eram construídas socialmente. A memória dos idosos
funcionava como uma ponte entre a geração do presente e as testemunhas do
passado. Atravessar essa ponte nos permite a descoberta de nossa identidade,
pois entramos em contato com as nossas raízes, e conhecemos a nossa própria
natureza.
Os
mais velhos eram responsáveis por transmitir, guardar e ensinar aos mais novos
o conhecimento adquirido, que dizia respeito ao funcionamento da sociedade e do
mundo que os cercavam. Walter Benjamin (1985, p.198) discorre sobre os
narradores anônimos, que se dividiam em dois grupos, nomeados por ele de
camponeses e marinheiros. Os camponeses falavam de sua terra e de suas
tradições, e os marinheiros, do saber de terras distantes. Estes foram os
primeiros mestres da narrativa, que se valiam do senso prático das histórias. O
conhecimento empírico era o ponto-chave dessas comunidades, por isso os mais
velhos eram tão valorizados e respeitados. Neles estava depositado o saber que
garantiria a sobrevivência de cada grupo social.
Havia,
portanto, uma preocupação em preservar o que era narrado, pois a narrativa
carregava em si “uma sugestão prática,
seja num provérbio ou numa norma de vida” (BENJAMIN, 1985, p. 200). A
relação entre narrador e ouvinte era um momento único de transmissão e
recepção, marcada por um intercâmbio de experiências. As pessoas se reuniam em volta de fogueiras
para ouvir histórias e conservá-las vivas.
Muitas
dessas histórias se perpetuaram em forma de conto, uma das formas literárias
mais conhecidas na literatura oral. Os contos de tradição oral são anônimos,
divulgados pela palavra falada e não se limitam geográfica, linguística nem
culturalmente. Segundo Coelho (1998,
p.22), os contos de fadas assumiam papel extremamente importante, tendo em
vista que eram produções que testemunhavam os valores da língua do povo, sua
maneira de ver e sentir a vida. Já Franz (1990, p.12) afirma que, através dos
escritos de Platão, sabia-se que as mulheres mais velhas contavam histórias
simbólicas às crianças. Continua ainda:
Até os séculos 17 e 18, os contos
de fada eram e ainda são nos centros de civilização primitivos e remotos –
contados tanto para adultos quanto para crianças. Na Europa eles costumavam ser
a forma principal de entretenimento para as populações agrícolas na época do
inverno. (FRANZ, 1990, p.12)
Para
Benjamin (1985, p.215) o conto de fadas foi o primeiro conselheiro das
crianças, porque foi também o primeiro da humanidade e sobrevive secretamente
na narrativa. Assim, afirma que o narrador de contos de fadas seria o primeiro
e o verdadeiro narrador. O seu papel ia muito além de contar histórias: era
também uma espécie de conselheiro, que retirava de sua experiência e da dos
outros as histórias que ele contava, inserindo em seus ouvintes a experiência
do que foi narrado, colocando na narrativa a sua marca.
MORTE DO
NARRADOR
Apesar
da importância da contação de histórias, assistimos ao seu desaparecimento. Na
Europa, após a Primeira Guerra Mundial, o desaparecimento da narrativa oral foi
ocorrendo em detrimento da leitura em voz alta. Já no continente africano,
devido à colonização européia, os contadores (griots) foram rechaçados pelos colonizadores. No Oriente Médio, o
desaparecimento ocorreu após a Segunda Guerra Mundial, e na América do Sul isso
ocorreu a partir do século XX, com a chegada da televisão.
Percebe-se
que, com a modernização das civilizações, a narrativa oral foi perdendo seu
espaço. Benjamin (1985, p.204) afirma que o fim da narrativa foi marcado pelo
surgimento do romance, pois “desaparece o
dom de ouvir, e desaparece a comunidade dos ouvintes”. Tendo em vista que o romance está atrelado ao
livro e à imprensa, ele se diferencia das outras formas de prosa, pois não
nasce na oralidade. Com o advento do livro, o narrador deixa de possuir um
público reunido a sua volta, e as experiências já não são compartilhadas. O
indivíduo isola-se: há atividade mais solitária que a leitura?
Para
a leitura se estabelecer é necessário que o silêncio reine. E foi o que
aconteceu com a narrativa oral, gradativamente silenciada na sociedade, que se
industrializava de maneira voraz.
Numa
sociedade industrial, informatizada e globalizada, a urbanização dos campos e a
aproximação de mundos e de distâncias são fatos incontestáveis. O modo de ver e
de viver a vida mudou. A imagem faz-se presente em toda parte; vivemos numa
sociedade extremamente visual, em que uma
imagem vale mais que mil palavras. Numa civilização de escrita e imagem,
isso tem autoridade. (COULET, 2001, p.187 apud MATOS, 2005, p.101).
Após
a voz da narrativa oral ser silenciada, observa-se, na sociedade atual, o
ressurgimento dos contadores de histórias. Matos (2005, p. XVII) faz uma breve
explanação sobre a volta dos contadores de histórias. A autora afirma que isso
ocorreu por volta de 1970, na Europa. Em fevereiro de 1989, na França,
realizou-se um colóquio com o objetivo de avaliar o impacto causado pela volta
dos contadores de histórias na sociedade. Nos grandes centros urbanos
brasileiros, a volta dos contadores de histórias ocorreu por volta de 1990.
CONTADORES
CONTEMPORÂNEOS OU URBANOS
É neste contexto que os contadores urbanos[2]
aparecem. Contudo, algumas diferenças entre os contadores tradicionais e os
urbanos são constatadas. Enquanto os tradicionais eram responsáveis por
transmitir o conhecimento, os valores e a cultura de seu povo, os contadores
urbanos têm por ocupação primeira o divertimento de seu público. Em análise a
essa diferença, a contadora de histórias, Adriana Maciel[3]
utiliza-se do termo “entretenimento cultural” para classificar essa ocupação. A
contadora explica: “a contação de
histórias é uma alternativa para quem não quer ir ao cinema ou não tem acesso
ao teatro por ser muito caro.”
A
contação de histórias, nos dias de hoje é um espetáculo em que a pessoa que
narra a história “conta num lugar que não
conhecia antes, para um público que ele encontra ali pela primeira vez, e que
possivelmente não encontrará depois do espetáculo.” (MATOS, 2005, p. 114).
O público do contador tradicional era a família e alguns amigos que se reuniam
para ouvir histórias, num momento de entretenimento e ensinamentos.
Matos
(2005, p.114-115), em sua obra, dialoga com muitos contadores de histórias,
dentre eles Roberto Carlos Ramos, contador de Minas Gerais, que comenta sobre
os aparatos que são utilizados pelos contadores urbanos:
Nós nunca mais vamos vivenciar, talvez só
existam em poucos locais, o contador primitivo, porque teve uma época que eles
tiveram preponderância, hoje não [...] Tudo que nós vamos fazer no palco passa
a ser um espetáculo, e eu não posso negar, eu vivo de contar histórias, sou
contador de história profissional. Na verdade eu não sou tradicional [...] Eu
acho que a partir do momento em que eu pisei num palco para contar alguma
coisa, para fazer um espetáculo, muda (...)
Tudo o que a gente coloca em volta é para ajudar, na verdade, a se
aproximar daquela realidade que existiu um dia. (...). É eu acho que
antigamente as coisas eram muito mais simples, eu tento trabalhar nessa
simplicidade, mas parece bobagem, não é nada, não é nada, tenho oito toneladas
de equipamentos de som que me acompanha, na minha simplicidade (risos), sabe,
um caminhão, um Scania, para levar caixas de som, palco e tudo quanto,
antigamente não precisava disso.
Todos
os recursos do contador de histórias tradicional acabam nele mesmo. Não havia
essa dependência que o contador, tido como profissional, tem de toda essa
tecnologia. Na verdade, esta ocupação
“contar histórias” ainda não faz parte da listagem de profissões regulamentadas
da Classificação Brasileira de Ocupações, publicada pelo Ministério do Trabalho
e Emprego. No entanto, o contador de histórias contemporâneo busca a
regulamentação de seu ofício.
A profissionalização não é a única diferença entre
os contadores tradicionais e urbanos. A escolha do repertório também é bem
diferente, para o tradicional “o
repertório encontrava-se no reservatório comum a todo o grupo e ele herdava
diretamente, podendo escolher o que melhor se adaptaria a sua personalidade.”
(MATOS, 2005, p. 115). Já para o contador urbano, a montagem de seu repertório
necessita, muitas das vezes, de uma fonte escrita. A recriação da oralidade
requer cuidado, pois é preciso estar atento às leis da oralidade, de maneira
tal que dê vida ao texto com a sua voz. E isso não ocorre apenas com a memorização
da história; é algo além.
A voz é o principal veículo do conto, mas não é o
único. O medievalista e crítico literário, Paul Zumthor, realizou um estudo
sobre a performance, que “se refere de modo imediato a um
acontecimento oral e gestual” (ZUMTHOR, 2007, p.38). A narração não se
sustenta apenas na voz, mas nos gestos, no olhar.
A performance
do contador de histórias implica
interação com o ouvinte: ‘a
“recepção” vai se fazer pela audição acompanhada da vista, uma e outra tendo
por objeto o discurso assim perfomatizado: é, com efeito, próprio da situação
oral que transmissão e recepção constituíam um ato único de participação’
(ZUMTHOR, 2007, p. 65). Contador e ouvinte se aproximam e experimentam juntos
tudo o que o conto proporciona. É o momento em que todos os sentidos e emoções
se misturam. Isso torna único o ato de contar histórias.
Esse ato único de participação é o que Benjamin, em
seu ensaio O narrador chama de
faculdade de intercambiar experiências. Um dos objetivos do retorno dos
contadores de histórias é resgatar esse intercâmbio de experiências. É uma
maneira de opor-se à literatura do tipo solitário e silencioso, além de
enriquecer a experiência comunicável.
Zumthor (2007, p.63-64) afirma que estamos numa nova
era da oralidade, bem diferente da tradicional. Anteriormente foi comentado
sobre o silêncio da voz do narrador, silêncio esse quebrado quando a voz é
reintroduzida na sociedade pelas artes. Para Zumthor, “a voz está ligada ao sentimento de sociabilidade (...), uma vez que
dois pares de ouvidos estão em presença um do outro, o daquele que fala e do
ouvinte”. (2007, p. 86)
O pensamento de Zumthor, atrelado ao de Benjamin,
confirma a singularidade do intercâmbio de experiências que acontece por meio
da voz. Estabelecer a relação entre experiência e voz é imprescindível para
termos uma noção da dimensão da contação de histórias.
TÉCNICAS PARA A ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS
Cléo Busatto (2003, p.47), atriz e contadora de
histórias, apresenta algumas técnicas utilizadas para o desenvolvimento da
narrativa do conto. Antes de mencionar qualquer recurso, a autora diz que o
segredo fundamental é que se conte com o coração. A escolha do repertório
também deve ser feita com o coração, deve haver identificação entre o narrador
e o conto narrado.
O contador de histórias deve ter a capacidade de
criar imagens, ele é uma espécie de tradutor incumbido de traduzir oralmente as
imagens contidas na história. São as imagens que nos colocam frente aos
personagens que tomam vida e se materializam pela narrativa.
Outra técnica explorada por Busatto (2003, p.56) é o
uso de onomatopéias, motivo pelo qual incentiva os novos contadores de
histórias a ampliarem o repertório de sons. A entonação de voz, o sussurrar, a
distinção de vozes dos personagens fazem parte desse repertório a ser explorado
por quem conta a história.
Os gestos, já tratados neste artigo, também entram
como recurso a serem utilizado no desenrolar da narrativa, pois também
funcionam como interpretação de uma ação.
A contadora Adriana Maciel também fala do uso de
recursos na narrativa, os quais ela denomina elementos. Referindo-se ao uso dos
gestos, ela fala sobre sua experiência ao contar O Gigante Egoísta, de Oscar Wilde. Em dado momento da narrativa,
Adriana, apontando para frente, indicou a direção em que o gigante olhava.
Simultaneamente sua voz ia construindo a ação do gigante: “...e quando ele olhou para trás...”, para
sua surpresa todas as crianças olharam para trás! Adriana poderia ter olhado
para trás também, mas preferiu indicar a direção em que o gigante olhou.
Através desta pequena sutileza no recurso utilizado, foi possível perceber como
as crianças estavam envolvidas nas histórias. Viraram personagem, inseridos
naquela trama. Considero isso o que há de mais bonito e intenso na contação de histórias.
Tanto Cléo Busatto quanto Adriana Maciel concordam
que o uso de recursos/elementos deve ocorrer moderadamente, pois quem deve
sobressair é a história, e não os elementos. Antes de mais nada, é preciso que
o conto e suas intenções sejam apreendidos pelo contador, para que ele reflita
sobre o recurso a ser utilizado. Feito isso, uma nova etapa surge: a
memorização do enredo do conto, por meio da criação de um roteiro memorizável.
O ritmo é o que confere musicalidade e harmonia a
narrativa (BUSATTO, 2003, p.65), por isso é necessário que o contador esteja
seguro e tenha o domínio da sequência do texto, caso contrário, não conseguirá
dar vida ao texto. Se a musicalidade tem este poder, o mesmo podemos dizer do
silêncio, que permite o florescimento da imaginação e o embarque dos ouvintes
na história.
CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS NAS ESCOLAS
A procura pela contação de histórias nas escolas
aumenta a cada dia, contudo é mais utilizada como um recurso didático do que
como prazer gratuito. O conto é visto
apenas como um pretexto do que se quer ensinar. Isso é uma maneira de
empobrecer o conto, por causa de um utilitarismo imediato. A respeito disso,
Jonas Ribeiro (2005, p.12) protesta:
Abaixo as
histórias utilitárias! Abaixo as histórias moralistas, doutrinárias! Viva o
lúdico pelo lúdico! Vivam as histórias que não conhecem os limites da realidade
palpável, as histórias que não são um mero pretexto para uma proposta
pedagógica.
A questão do uso da contação de histórias apenas
como mero pretexto pedagógico foi debatido com Adriana Maciel. A contadora
demonstra preocupação com o hábito que a escola tem de “pedagogizar” tudo,
pois, quanto isso ocorre, o valor da história fica comprometido, assim como o
prazer de se ouvir histórias. Todavia, isso não significa que o professor não
possa trabalhar o conto em sala de aula; é preciso pensar na abordagem.
A contação de histórias comumente está associada ao
incentivo à leitura, o que muitas vezes abafa a importância das histórias para
a formação da criança. Fanny Abramovich (2005, p.16) defende que “o primeiro
contato das crianças com um texto é feito oralmente, através da voz da mãe, do
pai ou dos avós, contando contos de fadas, trechos da Bíblia, histórias
inventadas [...] e outros mais.”
O processo de ouvir histórias estimula o imaginário
da criança, a possibilidade de conhecer novos mundos, resolver seus conflitos
internos e externos. Os contos são responsáveis por abrir as portas de
compreensão do mundo, pois eles falam de amor, abandono, tristeza, separação,
morte etc.
Pierre Lafforgue[4]
afirma: “a prática do conto vai deixar no
psiquismo da criança traços interiorizados, eventualmente reutilizáveis em
situações conflitivas ou angustiantes de mesma estrutura.” Por isso,
acredita-se que a iniciação da criança no mundo deve acontecer por intermédio
das histórias, pois, antes de ser leitora, a criança tem de ser boa ouvinte.
No Distrito Federal, a Secretaria de Educação
oferece aos seus professores cursos para formar contadores de histórias. Apesar
disso, não há projeto específico de implantação da contação de histórias, que
fica a critério de cada escola, em que geralmente o professor ou bibliotecário
elabora projeto nesse sentido a ser adotado pela escola.
Dentre as escolas públicas do Distrito Federal, a
escola Escola Classe 18, localizada em Taguatinga, é considerada modelo e tem
um projeto com contadores de histórias.
Em relação às escolas particulares, apenas o Colégio
Marista da Asa Sul possui contadores de histórias no quadro de funcionários,
mas a contação de histórias está associada ao uso de data-show. Essa prática compromete o processo de construção de
imagens visuais pela criança, empobrecendo o contar histórias.
GRUPO MATRAKABERTA
No
retorno dos contadores de histórias no Distrito Federal, percebe-se um movimento
ainda muito tímido e desarticulado em comparação a outros Estados brasileiros:
existem cerca de dez grupos de contadores de histórias[5],
que apenas se reconhecem como contadores, ou seja, esse é o único ponto que os
une. Apesar disto, gradativamente os contadores de histórias vêm
fortalecendo-se e sendo reconhecidos pela sociedade. Constata-se isso através
da procura por parte de escolas pela contação de histórias como meio de
incentivo à leitura. Outro aspecto que demonstra a força deste movimento é a
criação da Associação Brasileira de Contadores de Histórias com a intenção de
estruturar e organizar o segmento.
Para
se ter um conhecimento maior a respeito da contação de histórias, foi realizada
uma entrevista com o Grupo Matrakaberta –
História e Bonecos que foi prontamente receptivo e partilhou de sua
trajetória e experiências. O grupo foi criado em 2003 e é composto pela
contadora Adriana e pelo músico Marcelo. O primeiro contato de Adriana com a
contação de histórias ocorreu em 1998, quando a Rede Pública de Educação
ofereceu aos professores um curso de contadores de histórias na Oficina
Pedagógica de Brazlândia. Desta experiência nasceu o grupo Era uma vez, cujo repertório baseava-se nos contos de fadas e nas
lendas. Logo o grupo foi dissolvido, com a remoção das professoras que o
compunham para outra Regional.
O
projeto de contação de histórias, por um momento, adormeceu. Paralelamente a
isso a saúde de nossa contadora foi sendo afetada. O primeiro diagnóstico,
tendinite; o segundo, fibromialgia (doença psicossomática). Como terapia para o
seu caso, a psicóloga aconselhou que Adriana voltasse a contar histórias. Não
deu outra: seguindo as recomendações médicas e o seu coração, a contadora
acordou de seu sono, com novos projetos, ideias e sonhos. Era o início do Matrakaberta. Com a formação do grupo,
agregaram-se à arte de contar histórias a música, o folclore, as cantigas de
roda e muitas brincadeiras. Além de contar histórias, o Matrakaberta oferece seminários, palestras, cursos, assessoria
literária, oficinas de brinquedos populares e animação de festas infantis.
O
repertório do grupo é escolhido primeiramente pela identificação com a
história. Para ratificar tal afirmação, Adriana cita Jonas Ribeiro, escritor e
contador de histórias. Para ele, o contador de histórias primeiro namora a
história (leitura), depois fica noivo (apropriação da história, momento em que
se conhecem os detalhes e leem-se as entrelinhas) e, por fim, casa-se com ela
(momento em que decide contá-la). Quando a história é escolhida para ser
contada, surge a preocupação sobre qual será o elemento[6]
predominante ao se contar a história; escolhido o elemento, deve-se ter bom
senso ao usá-lo de modo que não venha a se sobressair em relação à
história. Adriana frisa que esta escolha
é muito relativa e que a própria história sugere o elemento – quando a história
já está internalizada, este processo ocorre naturalmente.
Um
contador de histórias não precisa decorar a história para contá-la; é
necessário apenas ter em mente seu esqueleto, ou seja, o seu enredo. Quando o
contador já se apropriou da história, nela começa a imprimir as suas marcas e a
inserir os detalhes da narrativa. Eis a riqueza da contação de história: cada
vez que é contada, renova-se e nunca será contada de maneira igual.
Outra
questão abordada na entrevista foi a maneira como se dá a interação com o
público, que muda a cada história. Isso depende também da receptividade do
próprio público e dos sentimentos que cada história provoca nos ouvintes, pois
o momento de contação é único. Para exemplificar, Adriana citou sua experiência
ao contar a parte da história da Bela
Adormecida em que o príncipe encantado iria beijar a princesa, quando um
passarinho entrou cantando no recinto. Neste momento, a história ganhou um novo
final: “e quando eles se beijaram, todos
os pássaros começaram a cantar...”. Poderia haver final mais mágico e
contagiante? Penso que não.
Esse
pequenos detalhes é que fazem adiferença na contação de histórias. Contudo,
vale lembrar que cada contador enxerga e é tocado pela história de maneira
diferente, por isso o enfoque será
trabalhado distintamente.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
O
poder da palavra falada reside em construir o mundo pela linguagem, tendo em
vista que no princípio era o verbo. Por essa mesma palavra o conhecimento de
mundo foi preservado através da memória dos contadores de histórias
tradicionais. Com o advento da escrita,
por muito tempo a oralidade foi relegada a segundo plano, em que o oral era
vinculado ao popular e a escrita ao erudito.
O
contador de histórias da atualidade tem,
em sua voz, a responsabilidade de preservar essa gama de conhecimento e também
de resgatar o compartilhar de
experiência entre as pessoas. O lúdico é muito importante para garantir o sucesso desse processo de sociabilização do
indivíduo, por isso não se pode mensurar a riqueza e importância da contação de
histórias para a formação de nossas crianças.
A capacidade
de reter na memória as histórias permite às crianças adquirirem conhecimento
prático da vida. Elas, através dos contos, serão capazes de se articular
melhor, pois inconscientemente assimilam a estruturação das narrativas, ampliam
seu repertório linguístico e dão asas à imaginação. Isso ocorre de maneira
espontânea, diferentemente do livro, que se sustenta por meio da escrita, que é
aprendida e não apreendida.
Diante de todas essas considerações, acredita-se na
necessidade de implantação da contação
de histórias no âmbito escolar. Entende-se que os frutos não são colhidos
imediatamente, mas, quando a criança é
iniciada no mundo pelas histórias, os
benefícios se perduram ao longo de sua vida.
ABSTRACT: The goal of this paper is
to analyze the resurgence of storytelling in the contemporary world. The
theoretical framework was made from the studies of literary critics Walter
Benjamin, in his essay "O Narrador"
and Paul Zumthor in "Performance,
Recepção, Leitura”. Before dealing
with the contemporary storytellers, it is necessary to refer to the role of
storytellers in antique times, who, through the usage of spoken word, passed
the values and knowledge of real life to the younger generation. Talking about
the storytellers implies also discuss the importance of spoken word tradition
in the formation of ancient societies.
Keywords:
Storytellers. Memory. Spoken word tradition. Performance.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
ABRAMOVICH,
Fanny. Literatura infantil:
gostosuras e bobices. 5ª Ed. São Paulo: Scipione, 1995.
BENJAMIN,
Walter. O narrador. In: obras
escolhidas - magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo:
Brasiliense, 1985.
BOSI, Ecléa. O
tempo vivo da memória: ensaios de psicologia social. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2003.
BUSATTO,
Cléo. Contar e encantar: pequenos
segredos da narrativa. Petrópolis: Vozes, 2003.
COELHO, Nelly Novaes. O
conto de fadas. 3ª. Ed. São Paulo: Ática, 1998.
FRANZ, Marie-Louise Von. A
interpretação dos contos de fada. 2ª. Ed. São Paulo: Paulus, 1990.
MATOS, Gislayne Avelar. A
palavra do contador de histórias. São Paulo: Maritns Fontes, 2005.
RIBEIRO, Jonas. Ouvidos
dourados: a arte de ouvir histórias para depois contá-las. 7ª Ed. São
Paulo: Ave Maria, 2005.
VANSINA, Jan. A tradição
oral e sua metodologia. In: História Geral da África. vol.1 Metodologia e
pré-história da África. São Paulo, Ática/UNESCO,1982, p.157-179.
ZUMTHOR, Paul. Recepção,
leitura e performance. São Paulo: Cosac Naify, 2000.
[1] Artigo apresentado ao Curso de Graduação em
Letras da Universidade Católica de Brasília como requisito para obtenção de
Título de Licenciado em Letras – Habilitação Português e Suas Respectivas
Literaturas. Orientadora: Prof.ª Dra. Andréa Márcia Mercadante Alves Coutinho.
Ano 2009.
[2] Termo extraído da obra: Busatto, Cléo. Contar e Encantar – pequenos segredos da narrativa. Petrópolis:
Vozes, 2003.
[4] 1988,
apud MATOS, 2005, p.138.
[5]
Informação obtida em entrevista realizada com Adriana de Oliveira Maciel,
contadora de histórias do Grupo Matrakaberta.
[6]
Entende-se por elemento o recurso utilizado em cada história para encantar no
momento da contação. Exemplos de elementos: uso de onomatopéia, gestos,
bonecos, plaquetas, varal, avental tecidos, peruca etc.
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Olha o que aprontamos.............
Resumo:
Na apresentação são contadas três histórias intercaladas com canções infantis, trava-linguas, cantigas de roda e brincadeiras infantis.
Os contadores caracterizam-se com roupas e acessórios artesanais.
Dependendo da história e usamos técnicas diferentes como bonecos, aventais, tapetes, fitas ou adereços que identifiquem e ilustrem a historia nas contações.
(Obs. Você escolhe as três historias que serão contadas)
Trabalhos
*Contação de histórias;
*Animação de festas infantis;
*Eventos em geral;
*Acessória literária;
*Seminários e palestras;
*Cursos para professores;
* Oficinas de Musicalização Infantil (com Instrumentos)
*Oficinas de brinquedos populares.
* Banda de Musicalização infantil
( voz, violão, bateria, percussão e contra-baixo )
A arte de encantar com historias

Uma historia bem contada você nunca esquece.
Trabalho de musicalização infantil

Banda matrakaberta Resumo da apresentação Cantamos cantigas de roda e MPB pra crianças num primeiro momento depois contamos historias musicadas com sonoplastia e no final fazemos uma recreação com brincadeiras de roda onde as crianças podem brincar com a música e o movimento corporal. Trabalhos a realizar Oficina de músicas infantis (MPB – pra criança) Oficina de cantigas de roda; Oficina de Musicalização infantil com instrumentos de percussão e materiais diversos; Oficina de brincadeiras de roda e dinâmicas de recreação e laser; Oficina de histórias cantadas;
Contação de Historias no evento do extra com a record

realização mix maketing eventos
fotos no blog http://bandamatrakaberta.blogspot.com

Brincadeiras,MPB pra crianças e cantigas de roda
Menina bonita do laço de fita

Ana Maria Machado
Menina bonita do laço de fita

fotos de Telmo ximenes
contação de historias no park shopping

historia: o vento norte
A Contadora de Histórias

Vento Norte
historia do você troca - Eva Furnari

Apresentacao no CCBB

Historia Vento norte Bia betran

Historia: o grande e velho urso

Musicalização infantil

percussão

voz e violao

musicalização infantil

percussão, gaita e flauta

História

História A VEIA DEBAIXO DA CAMA

Musica e História
RELEASE ( A VEIA DEBAIXO DA CAMA )
A véia debaixo da cama... Cada um tem uma mania esquisita, tem genteque coleciona selos, outros tampinha de garrafas, alguns sapatosesquisitos! A véia debaixo da cama coleciona bichos, tem rato,cachorro, galo e até cobra! Uma história engraçada, com uma véiasimpática e com cara de vovózona !
Uma história contada com uma vovó de pano, inventada de uma canção popular do tempo de nossos avôs que ainda hoje encante crianças e adultos de todas as idades.
Uma história contada com uma vovó de pano, inventada de uma canção popular do tempo de nossos avôs que ainda hoje encante crianças e adultos de todas as idades.
Historia Campo Santo

RELEASE (histórias para imaginar de Bia Bedran)
Apresentação (histórias para imaginar de Bia Bedran)- Campo santo Bia Bedran( Tatê Calanquê Catacan Quixilá Calanquê - Bia Bedran - A historia do menino que não tinha nome esta história conta a origem dos nomes de acordo com o folclore brasileiro).
Historia - O Sapo dentro do saco

fotos da Equipe Gustavo Fröner
Historia - A Bruxa do Avental

Historia - A Bruxa huhuhhuhhuhu........

Historia em festas

fotos Os créditos são: Equipe Gustavo Fröner
Historias em festas

Técnica boneco de manipulação direta que ilustra a história cantada
REALISE (A FESTA DO BOI BUMBA)
(Uma incrível viagem pelo nosso folclore, histórias fascinantes do boi da burrinha e do Jaraguá. Tudo com muita música e animação).
História - O BOI BUMBA
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MusÍca do carroça de mamulengo
História - A FESTA DO BOI BUMBA
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Historia - Boi Bumba
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Boneco de manipulação direta
Historia - O jaragua

Apresentação na feira do livro de Brasilia
Manipulação Direta Boneco de Vara
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Historia - A burrinha
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Musica do carroça de mamulengo
A História De Tatê Calanquê Catacan Quixilá Calanquê

Historia da Bia Betran
Historia - Pandolfo bereba eva furnari

Apresentação feita no Colegio Vitoria do Gama/DF
RELEASE (CLASSICOS DA LITERATURA INFANTIL E CONTOS DE FADAS)
(Contos de fadas dos três porquinhos em uma versão adaptada onde os porquinhos crescem e se tornam músicos para formarem uma banda)
HISTORIA: A banda dos tres porquinhos
TECNICA: Tapete contador de histórias
HISTORIA:A bruxa do avental
TECNICA: Avental contador de historias
HISTORIA:O grande velho urso
TECNICA: Livro ilustrado
HISTORIA: A banda dos tres porquinhos
TECNICA: Tapete contador de histórias
HISTORIA:A bruxa do avental
TECNICA: Avental contador de historias
HISTORIA:O grande velho urso
TECNICA: Livro ilustrado
Historia - Pandolfo bereba Eva Furnari

Tecnica do varral contador de histórias
RELEASE (EM EVA FURNARI- HISTÓRIAS PARA PROVOCAR)
Apresentação (EM EVA FURNARI- HISTÓRIAS PARA PROVOCAR)
( Pandolfo Bereba pretendem, numa linguagem humorada, propiciar um material provocativo, gerador de reflexões acerca desses princípios evalores).
Você troca uma história musicada de rimas engraçadas.
( Pandolfo Bereba pretendem, numa linguagem humorada, propiciar um material provocativo, gerador de reflexões acerca desses princípios evalores).
Você troca uma história musicada de rimas engraçadas.
Historia de natal
Presepio
OFICINA DE MASCARAS DE CARNAVAL
Oficina de piao carapeta

Oficina roi-roi

OFICINA ROI-ROI
Nesta oficina, as crianças poderão vivenciar a incrível experiência deconstruir seu próprio brinquedo. Todo com material reciclado. O Roi-Roi, um brinquedo popular, se apresenta como um instrumentomusical, de fácil construção.
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